Sempre me causou depois
de adulto uma preocupação com essa coisa de criança brincando com replicas de
arma de fogo. No meu tempo de menino nossas brincadeiras eram o futebol no
Campo do Fabril nos fins de tarde e à noite costumávamos brincar de cowboy
improvisando revólveres e espingardas com pedaços de madeira. Vez por outra a
gente inventava de brincar de luta de capa e espada ao estilo de Zorro, o
fidalgo e cavaleiro mascarado dom Diego de La Veja. O brinquedo inocente era
feito com aquelas palhas de carnaúba das quais se fazia o cavalo e a espada.
Naquele tempo a
violência urbana era um aqui e ali, bem diferente de hoje onde menino nem pense
em meter a cara na porta depois das seis da tarde quanto menos sair pela rua em
algazarra. E esse negócio de comprar brinquedo em loja e quanto mais brinquedo
caro, era coisa que nem dava pra pensar. Mas nós tínhamos, isso coisa de criança,
inveja de quem chegasse ao grupo com um revólver daqueles de ferro fundido, da
Estrela, dito de espoleta, cabo branco e ainda por cima dentro de um coldre de
couro ou até mesmo de plástico. Aquilo, a gente pensava, nunca seria pro nosso
bico.
Nós meninos, quando
dava, comprávamos desses revólveres ou pistolas de plástico de brinquedo. Mas
nós meninos tínhamos consciência de que aquele brinquedo era um brinquedo, e
que eu me lembre, nunca passou pela cabeça de qualquer um de nós transformarmos
aquele tipo de brinquedo como objeto amedrontador de pessoas pra prática de
delito. Porque na nossa ideia de meninos, com família composta de pai mãe,
irmãos, havia sempre uma imensa fronteira, um muro muito alto e robusto entre a
fantasia e a realidade.
E estes dias eu
visitando uma dessas lojas ditas de artigos importados, como costumo fazer de
vez em quando aos sábados, estava observando numa prateleira cheia de
brinquedos e entre alguns eu encontrei as réplicas perfeitas de pistolas. Cores
berrantes, bem amarelas. E me recordo de há temposrecentes o governo ter
proibido a indústria de fabricar este tipo de brinquedos assim também como a
importação, exposição e venda, salvo se descaracterizado pela cor. Mas fiquei a
observar preocupado quem se interessava pelo tal brinquedo.
O que vi não me causou
surpresa. Rapazinhos e até adultos observando, testando, envaidecidos com as
tais pistolas amarelas, réplicas perfeitas dessas que se vê em posse de
policiais. E pela aparência silenciosa e desconfiada deles, longe de parecer
preconceituoso, eram meninos e rapazes de periferia. Periferia aonde a
violência não respeita ninguém e muito menos criança. Estavam ali enternecidos
com aquele brinquedo proibido que, comprado por pouco mais de trinta reais vai,
depois de pintado, servir de arma pra intimidar alguém nalguma esquina dessas
da cidade ou até consumar um crime de assalto. Aquele
brinquedo depois de pintado, nas mãos de uma criança, adolescente e até adulto
é mais uma arma na praça.
Paduá Marques
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