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quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Tomásia, Almir e Custódio

Antônio de Pádua
Nesses dias em que se comemora a Semana da Consciência Negra recordo de três pessoas simples de Parnaíba, bons cidadãos, que aos olhos de hoje bem que poderiam ilustrar este movimento de reivindicações coletivas das chamadas minorias e que foram ainda na minha infância peças importantes de referência. Cada um ao seu tempo e espaço deu a contribuição necessária pra que o mundo e as suas instituições chegassem ao momento de hoje. E olhando neste momento suas vidas e dando sentido ao que fizeram é fácil compreender o papel de cada uma.

Tomásia dos Santos era nossa vizinha da Rua James Clark, no bairro de Fátima. Mulher de João Batista dos Santos, ele da segunda geração da dinastia dos negros macaés, região do Testa Branca, onde hoje é o bairro Catanduvas. Teve uma penca de filhos entre homens e mulheres. Era agregada da família Bompet, lá de dentro da rua, era assim como se chamava naquele tempo quem morava no centro, os considerados ricos. Exímia doceira, Tomásia tinha uma clientela fiel entre os seus antigos patrões ou os Athayde, os Santos, Lustosa Nogueira, Veras e os Machado. Sua fama ultrapassou as fronteiras da Parnaíba até mesmo quando já não mais mexia nos tachos de cobre.

Conta a história e canta a lenda que Getúlio Vargas quando visitou Parnaíba, hóspede de João Orlando de Moraes Correia, entre uma audiência com os figurões da cidade promoveu uma rápida fuga até a cozinha e lá encontrou na mesa uma compoteira com o melhor da produção de negra Tomásia. O presidente não teve cerimônia de abrir aquela peça de vidro, provar do doce e sair lambendo os dedos. Soube dona Tomásia preservar sua simplicidade e intimidade. E somente saiu dela depois de morta quando o Bloco Macacau anos depois lhe prestou homenagem, mais que merecida. Bem que poderia o pequeno trecho da rua em que morou e fez fama receber hoje o seu nome.

O maestro Almir Araújo, ilustre morador da Rua Francisco Severiano, não foi praticamente um negro. Era mais pra pardo, mas tinha o pé cinzento. Mas era músico genial. Amigo de grandes artistas nacionais. Compunha feito ninguém tendo sido praticamente um dos fundadores da Banda Municipal pra onde entrou ainda rapazinho aos dezoito anos. Sua obra mais falada e praticamente esquecida é a valsa Dois de Abril, infelizmente perdida após sua morte, assim como toda a outra memória fotográfica e outros documentos. Sua morte em 1966 trouxe uma multidão de gente pra pequena casa do bairro de Fátima. Ganhou quando muito uma rua pequena no bairro do Carmo com seu nome.

Mas é em Custódio Amorim que os negros parnaibanos vão encontrar pra história seu momento mais solene. O negro legítimo, desses do pé cinzento, líder sindical depois tendo assento na Câmara Municipal por vários mandatos. Era um articulador nato e esteve sempre no meio das grandes decisões e ao lado dos ditos parnaibanos de sangue azul. Tão importante e tão desimportante pra nossa história ao mesmo tempo. Lembro que por ocasião a vinda de Garrastazu Médici pra inauguração do Polivalente em 1973, Custódio, cheio de coragem, mandou horas antes afixar uma faixa cumprimentando o visitante em nome dos parnaibanos e de seus liderados. Antes que o general entrasse na Avenida São Sebastião vindo da Praça da Lagoinha e descesse do carro a faixa foi violentamente retirada. Foi tão desimportante pra história que, sendo presidente da Câmara Municipal o vereador Paulo Evangelista, também negro, amigo e confidente de Mão Santa, deu nome a um anexo daquela casa com direito a até fotografia e nome na parede. Mal acaba o mandato de Paulo Fofoca e o sucessor minimiza o feito, manda pintar a parede onde estava o nome do negro. O retrato, esse, certamente foi parar nalgum armário nos fundos do prédio pra depois ganhar o rumo do lixo.

Por Antônio de Pádua

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